Sinto que o mundo gira embaixo dos meus pés, posso recuperar a fé mesmo que seja só um momento.

Kira Yagami
6 min readMar 10, 2022

Acho que são raras as vezes que eu começo a escrever sem ter noção do conteúdo ou sem ter um guia e acompanhado de uma série de anotações por todos os lados do texto, anotações essas que nunca apareceram e espero eu que nunca irão. Minha questão com a guia de um texto não é não ter feito ela, mas sim, que eu simplesmente não consigo falar de todas as coisas que tem acontecido comigo, o meu tempo é bem curto e eu procuro tentar aproveitar ao máximo, me concentrar escrevendo algo que eu goste nem sempre é fácil, vide a quantidade de textos que eu já comecei e simplesmente joguei fora.

Eu já pensei em temas políticos, sociais e pessoais e no final, esse texto deve ser sobre tudo isso junto, misturado com mais algumas coisas que aparecerem pela minha cabeça enquanto eu escrevo.

Na terra do R retroflexo eu continuo me admirando, não só com as coisas boas da cidade que aos poucos eu tenho aprendido a amar e odiar, mas São Paulo tem me mostrado uma parte de mim que eu um dia achei que era mentira. A minha saudade de “casa” as vezes me bate, as vezes eu romantizo demais e é proposital, numa cidade de prédio em todos os lados eu sinto uma falta específica do sol do Tanguá, da maresia, de me machucar nas conchas, de pular de uma pedra na outra e dessa outra diretamente no mar, do cabelo duro do sal, da boca seca que eu finjo que é motivo para ir atrás de mais uma lata de Brahma, lata essa tão sumida por aqui.

Eu passo dias seguidos olhando pela paisagem do metrô de superfície onde eu vejo rios, carros, motos e pessoas, muitas pessoas, enquanto eu ouço alguma coisa que eu já ouvi várias vezes, mas não canso de ressignificar. Sejam versos, sejam poesias, sejam futuros, eu nunca canso de ouvir e pensar e me perder, as vezes eu consigo fazer desaparecer todos os carros, todos os prédios e as pessoas também, sendo assim, busco ali a força de vontade de mais um dia. Pela falta de consistência na escrita eu tenho certeza que esse vai ser um dos meus textos mais falhos, mas com certeza é do fundo do coração.

Não é que São Paulo seja um lugar ruim, mas ela carrega algo que anestesia os dias, parecem todos iguais, todos o mesmo dia, todos os mesmos problemas. São Paulo parece um dia que realmente nunca acaba, não porque ela não durma, o que também é um fato, mas porque ela faz parecer que você existe num ciclo sem fim, ciclo que as vezes você tenta fugir e parece cada vez mais ser punido, mas é justamente a fuga que os fones me ajudam a criar. É quase um clichê que a música nos mantenha em movimento, mas o movimento que ela me ajuda a manter é mental e psíquico, essa tem sido minha maior psicóloga desde que eu cheguei em terras paulistas.

Acho que todo texto que eu falo sobre São Paulo eu tenho medo de estar sendo chato e criticando a cidade onde eu moro, mas é meu medo de atribuir culpa a algo que na verdade é comigo, São Paulo não me obrigou a vir, eu me decidi.

Apesar do disclaimer, São Paulo é um lugar de mentira, não que isso se aplique aos paulistas, mas literalmente, você encontra todo tipo de coisa em São Paulo e justamente por isso faz com que pareça quase de mentira, quase que pra vender. Eu passei por diversos bares aqui que tem o Rio como matriz cultural, o samba, o Cristo, Copacabana, mas em nenhum desses lugares eu me sinto em casa, eu já vi diversas camisas do flamengo aqui, mas nenhuma delas parece real. São Paulo tem tão de tudo e tantas coisas que você se pergunta, afinal, essas coisas são reais? Elas existiriam de verdade em São Paulo?

Apesar de parecer crítico à cidade, esse é o resultado de toda massa cosmopolita, ela tem dificuldade de ser original e é dessa forma que ela funciona, São Paulo tenta agradar todo mundo em volta dela e isso me faz pensar se eu é que não sou chato de um jeito que São Paulo não consiga me persuadir. De toda forma é estranho pensar que eu gosto daqui, gosto de morar aqui e das coisas que tem por aqui, mas ao mesmo tempo não gosto, as vezes eu me pergunto se todo paulista se sente assim, ou se todo migrante se sente assim. Ou será que assim como São Paulo, eu também esteja tentando agradar a todos e me perdendo em essência?

Eu devo ser o maior dos alvos das gravadoras de porcarias sonoras, porque, mesmo sabendo que se trata de uma produção focada em me fazer lembrar de refrões e melodias fáceis, eu continuo lá, correndo atrás e cantarolando. Olhando em retrocesso, eu acho engraçado como isso perdura por anos, eu montei uma playlist de J-music, como se o Kira de 14 anos estivesse montando e no final, eu acabo gostando quase das mesmas coisas, mas agora eu entendo como são ruins, isso me faz pulá-las? Nunca!

Orange Range, Hirano Aya, Yui, minha adolescência foi permeada disso, desse caldo cultural de anime, mangá, hentai e otaku, meu apelido, meus amigos e os apelidos dos meus amigos como Suna, Malice, Nana, Ko, ouvir esse tipo de coisa é mais do que lembrar do Kira de 14 anos que matava aula e ia assistir o Ichigo virando um monstro e estourando o Ulquiorra na porrada, isso me fazia lembrar dessa época, onde eu poderia dizer que tudo era colorido, mas cabe aqui uma dose generosa de nostalgia e infelizmente é o tipo de coisa que custaria a voltar.

Acho engraçada essa coisa do Kira, porque aqui em São Paulo meus círculos são quase que todos profissionais e isso faz com que em São Paulo o Kira não exista, o que é quase uma metalinguagem, o Kira não existe, e essa frase caberia na utopia de muita gente, infelizmente.

Assim como todo mundo eu também sou uma soma de acontecimentos já destinados ou não, mas certos gostos e coisas que eu abandonei pelo capitalismo me fazem realmente pensar se a minha alma já foi vendida. Eu tenho saudades dele, de verdade, eu já não me encontro mais, não me concordo mais, não procuro meus achismos em mim mesmo, eu me sinto uma pedra coberta pelo mar, que simplesmente esqueceram que existe, o pior é saber que o mar é muito maior do que eu, apesar de tudo, eu continuo aqui, torcendo pela maré baixa onde um dia, como a Viradouro tanto cantou, eu vou voltar a sorrir.

Continuando no que tange ao samba, a mocidade me ensinou que sonhar não custa nada, então, eu continuo sonhando e procurando a tal estrela de luz que me conduz. Esse texto é quase um grito de socorro, um pedido de ajuda e que apesar de um dia poder ser atendido, eu não saberia explicar onde e em que eu preciso de ajuda.

Eu nunca gostei de textos tristes, eu nunca gostei de ler lamento e choro, até hoje eu fujo de animações porque elas são extremamente emocionantes, buscam no fundo da gente aquela sensação, eu poderia citar uma lista de cenas de animações que me fizeram chorar, desde Carros até Divertidamente. Acho que isso fez com que esse texto demorasse tanto a acontecer, não só a falta de tempo, mas a questão: Você quer contribuir com mais lamento e melancolia num mundo onde a gente perde as contas de motivos pra chorar?

Eu não me sinto mais na Barrenkalle, não tenho todas as portas da rua para escolher e entrar, eu me sinto como Rumbler do Black Lips onde eu só tenho que ir em frente, ou talvez como GUINEU em Putu Any e toda a frustração de um ano arruinado por uma doença que nunca mais deve ir embora. Eu deveria me sentir mais como La Estacion Espacial de Teruel da Maren e torcer pra sumir.

Eu não sei se deveria me procurar até me achar, como diria Cartola, mas as vezes eu sinto que eu já me perdi em um ponto de não retorno. Acho que eu morri de vez e as vezes vejo pelos sentimentos e sensações como é a vida lá fora, como um espirito que observa a vida continuar depois da morte e preso ali, vai continuar até que algo fora de seu controle mude isso. De toda forma, eu tento ser um fantasminha camarada, mas nem todo mundo concorda com isso.

A saudade da minha galera me mantém vivo, mesmo que as vezes eu ache que não.

Oh minha maconha

Minha torcida

Minha querida

Minha galera

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Kira Yagami

ENFJ, Professor de história, baterista sem foco, Sage nas horas vagas.