Qual a diferença entre o Metal e o Punk? Um anda simples e o outro arrogante

Kira Yagami
7 min readSep 12, 2019

Não é que a sociedade deveria sempre reconhecer seus filhotes toda vez que os encontra, mas é clássica a confusão entre o termo “punk” e o termo “metal”. Quando isso se aplica ao contexto brasileiro é bem mais frequente porque a maneira com que o Brasil aprendeu a lidar com a palavra “punk” remete a algo pesado ou agressivo quando na verdade é mais voltado a “sujo” ou “podre”. Metal tende a ser lembrado por algo que o Brasil inventou e é piada em qualquer tipo de transmissão midiática, o “rock paulera”, escrito assim sem o i, basicamente define o termo ‘heavy metal thunder” que é uma das origens do gênero heavy metal na virada dos anos 60 para os 70 com Black Sabbath e Led Zeppelin.

Num rápido resumo, o rock nasce nos anos 50 e seu expoente seria Elvis Presley, daí o termo Rei do Rock, nos anos 60 a invasão britânica beatlemaniaca se mistura com a política americana e o rock progressivo ganha espaço, nos anos 70 o punk aparece tentando combater o rock progressivo e o heavy metal aparece como um meio termo entre os dois, dos anos 80 em diante tudo isso se divide, se mistura, se rearranja e centenas de ritmos e gêneros pulam dentro da sociedade. Dependendo da situação é simplista gostar de rock porque aqui entra a famosa pergunta sem resposta que é “o que é rock?”, também é daqui que nasce a diferença entre o metal e o punk.

Se você realmente está lendo isso sem a fazer menor ideia do que é metal ou punk, eu sugiro pesquisar “Blitzkrieg Bop” no youtube e além de descobrir que você já ouviu isso em algum lugar, você vai descobrir a música punk em todo seu esplendor, simples, rápida, direta e acessível, particularmente eu diria que “Smoke On The Water” do Deep Purple seria o equivalente do metal, tem um riff de guitarra que a bateria bem seca conduz, tem uma certa elaboração e o peso que o metal gosta de criar, sendo assim, metal e punk são coisas diferentes desde seu conceito mas são como dois filhos de um mesmo pai, um é o que decidiu seguir carreira acadêmica e teve futuro, hoje vive dos investimentos do passado, o outro usou todas as drogas que encontrou, saiu numa briga de faca, teve um filho com cada namorada e morreu com 30 anos.

O rock nasce de um tipo de rebeldia, então os dois gêneros são rebeldes mas cada um vai sofrer de maneira diferente as mudanças do tempo, o metal se molda muito melhor a mídia e a sociedade, a prova disso são as bandas que até hoje são lembradas, tudo bem que já passou a era de ouro do metal, mas se colocado em contraponto com o punk, o metal ao menos teve uma era de ouro para chamar de sua. Por sua vez o punk já nasceu contraditório e sem futuro, como cantado em “God Save The Queen” dos Sex Pistols, a maneira de ser rebelde era inclusiva, era fácil de fazer parte, qualquer tipo de coisa era aceito porque eram anos de DIY, os ditos anos 70, já o metal prezava por coisas melhores, as bandas dos anos 70 tem o mesmo tipo de contato com a sociedade, drogas, bebida, rebeldia e barulho, Ozzy até hoje é lembrado pelas histórias de loucuras que fez durante esse tempo, o próprio Led Zeppelin tem histórias absurdas sobre groupies e orgias.

É daqui em diante que os dois mundos se separam em coisas bem complicadas, o punk se torna ferramenta da pós-modernidade e vai passar a dar lugar para todo tipo de minoria musical, gêneros e sub-generos e o metal segue o mesmo caminho, mas ainda sendo o tipo de música elaborada e superior, superior no sentido de dificuldade, já que o metal não preza pela acessibilidade e daqui começam a nascer dois públicos completamente diferentes. O cabelo longo e muitas guitarras são elementos do metal, enquanto o moicano é elemento do punk, o metal acaba por ser escolhido por uma legião de fãs que dão importância a essa superioridade musical, infelizmente isso acaba gerando a superioridade em outros aspectos e gerando a tal arrogância, o metal se sente melhor porque é mais difícil.

Cabe aqui o disclaimer de que isso é uma análise (tirada da bunda) sociológica e pode muito bem ter suas exceções, não é como se eu estivesse chamando todos os fãs de Metal de arrogantes, mas tem certos fãs que fazem gosto disso. Além disso esse texto não é a favor da separação das pessoas ou dos gêneros (Uma vez que o autor é punk, é acessível J)

Não se enganem pela diferença, os dois gêneros vão fazer músicas sobre temas iguais, amores não correspondido, morte, guerra, drogas, festa, amores correspondidos, política e tantos outros assuntos, mas o punk age bem mais sobre temas sociais e em termos claros, o metal é mais artístico, colocando o conceito de arte como algo elaborado, e o punk mais rebelde.

No contexto das terras tupiniquins, os dois se misturaram e os jovens consumidores simplesmente ouviam tudo como “rock”, foi no início dos anos 80 com a lei de anistia da ditadura civil-militar brasileira que as duas coisas começaram a se separar e criar grupos, o metal se popularizou e cinco anos depois o rock in rio acontecia e o Brasil inteiro ia a deleite, podemos citar bandas como Whitesnake, Queen, Iron Maiden, Yes e Scorpions, todas voltadas ao público que consumia metal, o rock in rio foi um sucesso e até hoje existe como marca e gera rios e rios de dinheiro. Do outro lado da moeda, acontecendo em São Paulo, três anos antes o até então maior festival punk do Brasil terminava numa briga sangrenta contra a polícia paulista e a maior parte dos leitores desse texto sequer ouviu falar do “Começo do Fim Do Mundo”, nome dado ao festival. Fica bem claro como o metal é midiático, funcional, se adapta a sociedade e até mesmo respeitado como arte e o punk é tido como lixo, disfuncional e antissocial e antes que isso pareça um lamento, é exatamente isso que o punk se propõe a ser, já que é no mesmo ano de 1982 que os Garotos Podres lançam o primeiro disco, extremamente político e adaptado ao Brasil. No fundo o punk se auto destrói para se reconstruir em seguida e o metal segue uma linha ascendente.

Do Punk ao Funk

Certa vez Tim Maia foi colocado no mesmo lineup de um show punk que ocorreria no Circo Voador e assim que a banda abriu ele ficou doido e a discussão começou, as palavras de Tim foram “lixo em dois acordes”, mesmo assim a banda foi até o final e depois Tim Maia subiu no mesmo palco, no fim da noite os próprios punks já estavam no camarim com Tim Maia. Essa história é contada por Nelson Motta na biografia de Tim Maia e é muito importante cruzar os dois caminhos. O punk é uma música de protesto e de gente pobre, daí a veia social, ainda mais adaptada ao Brasil, que sofre em vários graus com esse tipo de problema, o punk seria totalmente assemelhado ao funk e não ao funk do Tim e do Jorge Ben, ao funk da favela, de gente pobre e sem voz que só quer poder passar sua mensagem, ou seja o punk é acessível assim como o funk é acessível, daí também a ligação do punk e do rap, os dois dão muito mais importância a mensagem a se passar do que com a arte e toda a elaboração de como a mensagem vai ser passada. O punk é exatamente o mesmo grito do subúrbio que o funk se aplica hoje e advinha, o funk é tido como lixo musical tal qual seu irmão de pai diferente, o funk se rearranja, fala de temas políticos, fala de sociedade, fala de festa e ganha as vielas com a simplicidade musical.

A maior confusão entre metal e punk é semântica e tem culpa midiática, o termo punk sempre foi vinculado a coisas agressivas e o termo metal vinculado a “gritaria” e por mais que ambas as definições sejam factuais, causa ambiguidade e relativiza-se no sentido de o que é “agressão”? Agressão poderia ser entendido pelo peso do metal, mas poderia ser entendido pela rapidez do punk. Num contexto que não é regra, o punk se encontra bem mais ligado a músicas de protesto como a mpb, como o samba e o funk, enquanto o metal pode vir a ser ligado com coisas bem mais cultas como a música clássica, claro que aqui se trata de um metal progressivo, que seria em conceitos, o maior e mais abominável inimigo do punk.

Disclaimer Final: Pode ouvir os dois, nada disso acima é regra, a maioria das pessoas tem a capacidade de gostar/apreciar/ouvir mais do que uma coisa só, o texto busca uma análise social dos dois gêneros e a aplicação desses conceitos no contexto brasileiro. Se você chegou aqui e não entendeu nada de Punk e Metal, segue abaixo a lista.

Metal

Smoke On The Water — Deep Purple

Rock n’ Roll — Led Zeppelin

Paranoid — Black Sabbath

Punk

Blitzkrieg Bop — Ramones

God Save The Queen — Sex Pistols

London Calling — The Clash

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Kira Yagami

ENFJ, Professor de história, baterista sem foco, Sage nas horas vagas.